Leia o trecho de O Uraguai para responder a questão.
Cansada de viver, tinha escolhido
Para morrer a mísera Lindoia.
Lá reclinada, como que dormia,
Na branda relva e nas mimosas flores,
Tinha a face na mão, e a mão no tronco
De um fúnebre cipreste, que espalhava
Melancólica sombra. Mais de perto
Descobrem que se enrola no seu corpo
Verde serpente, e lhe passeia e cinge
Pescoço e braços, e lhe lambe o seio.
Fogem de a ver assim, sobressaltados,
E param cheios de temor ao longe;
E nem se atrevem a chamá-la, e temem
Que desperte assustada, e irrite o monstro,
E fuja, e apresse no fugir a morte.
Porém o destro Caitutu, que treme
Do perigo da irmã, sem mais demora
Dobrou as pontas do arco, e quis três vezes
Soltar o tiro, e vacilou três vezes
Entre a ira e o temor. Enfim sacode
O arco e faz voar a aguda seta,
Que toca o peito de Lindoia, e fere
A serpente na testa, e a boca e os dentes
Deixou cravados no vizinho tronco.
Açouta o campo co’a ligeira cauda
O irado monstro, e em tortuosos giros
Se enrosca no cipreste, e verte envolto
Em negro sangue o lívido veneno.
Leva nos braços a infeliz Lindoia
O desgraçado irmão, que ao despertá-la
Conhece, com que dor! no frio rosto
Os sinais do veneno, e vê ferido
Pelo dente sutil o brando peito.
Os olhos, em que Amor reinava, um dia,
Cheios de morte; e muda aquela língua
Que ao surdo vento e aos ecos tantas vezes
Contou a larga história de seus males.
Nos olhos Caitutu não sofre o pranto,
E rompe em profundíssimos suspiros,
Lendo na testa da fronteira gruta
De sua mão já trêmula gravado
O alheio crime e a voluntária morte.
GAMA, Basílio da. O Uraguai. Rio de Janeiro: Record, 2006. p. 82-83.
Identifique a alternativa correspondente à sequência correta de nomes de figuras de estilo presentes nos trechos abaixo enumerados, constantes no trecho de O Uraguai.
1. “Cansada de viver, tinha escolhido/ Para morrer a mísera Lindoia”.
2. “Do perigo da irmã, sem mais demora”.
3. “Descobrem que se enrola no seu corpo/ Verde serpente, e lhe passeia e cinge”.
4. “Que ao surdo vento e aos ecos tantas vezes/ Contou a larga história de seus males”.
5. “Lendo na testa da fronteira gruta/ De sua mão já trêmula gravado.”
Leia o conto de Antônio de Alcântara Machado para responder a questão.
Gaetaninho
– Chi, Gaetaninho, como é bom!
Gaetaninho ficou banzando bem no meio da rua. O Ford quási o derrubou e êle não viu o Ford. O carroceiro disse um palavrão e êle não ouviu o palavrão.
– Eh! Gaetaninho! Vem pra dentro.
Grito materno sim: até filho surdo escuta. Virou o rosto tão feio de sardento, viu a mãe e viu o chinelo.
– Subito!
Foi-se chegando devagarinho, devagarinho. Fazendo beicinho. Estudando o terreno. Deante da mãe e do chinelo parou. Balançou o corpo. Recurso de campeão de futebol. Fingiu tomar a direita. Mas deu meia volta instantânea e varou pela esquerda porta a dentro.
Eta salame de mestre!
Ali na Rua Oriente a ralé quando muito andava de bonde. De automóvel ou carro só mesmo em dia de entêrro. De entêrro ou de casamento. Por isso mesmo o sonho de Gaetaninho era de realização muito difícil. Um sonho.
O Beppino por exemplo. O Beppino naquela tarde atravessara de carro a cidade. Mas como? Atrás da Tia Peronetta que se mudava para o Araçá. Assim também não era vantagem.
Mas se era o único meio? Paciência.
Gaetaninho enfiou a cabeça em baixo do travesseiro.
Que beleza , rapaz! Na frente quatro cavalos pretos empenachados levavam a tia Filomena para o cemitério. Depois o padre. Depois o Savério noivo dela de lenço nos olhos. Depois êle. Na boléia do carro. Ao lado do cocheiro. Com a roupa marinheira e o gorro branco onde se lia: Encouraçado São Paulo. Não. Ficava mais bonito de roupa marinheira mas com a palhetinha nova que o irmão lhe trouxera da fábrica. E ligas pretas segurando as meias. Que beleza, rapaz! Dentro do carro o pai, os dois irmãos mais velhos (um de gravata vermelha, outro de gravata verde) e o padrinho seu Salomone. Muita gente nas calçadas, nas portas e nas janelas dos palacetes, vendo o entêrro. Sobretudo admirando o Gaetaninho.
Mas Gaetaninho ainda não estava satisfeito. Queira ir carregando o chicote. O desgraçado do cocheiro não queria deixar. Nem por um instantinho só.
Gaetaninho ia berrar mas a tia Filomena com mania de cantar o Ahi, Mari! todas as manhãs o acordou.
Primeiro ficou desapontado. Depois quási chorou de ódio.
Tia Filomena teve um ataque de nervos quando soube do sonho de Gaetaninho. Tão forte que êle sentiu remorsos. E para sossêgo da família alarmada com o agouro tratou logo de substituir a tia por outra pessoa numa nova versão de seu sonho. Matutou, matutou e escolheu o acendedor da Companhia de Gás, seu Rubino, que uma vez lhe deu um cocre danado de doído.
Os irmãos (êsses) quando souberam da história resolveram arriscar de sociedade quinhentão no elefante. Deu a vaca. E êles ficaram loucos de raiva por não haverem logo adivinhado que não podia deixar de dar a vaca mesmo.
O jôgo na calçada parecia de vida ou morte. Muito embora Gaetaninho não estava ligando.
– Você conhecia o pai do Afonso, Beppino?
– Meu pai deu uma vez na cara dêle.
– Então você não vai amanhã no enterro. Eu vou!
O Vicente protestou indignado:
– Assim não jogo mais! O Gaetaninho está atrapalhando!
Gaetaninho voltou para o seu posto de guardião. Tão cheio de responsabilidades.
O Nino veio correndo com a bolinha de meia. Chegou bem perto. Com o tronco arqueado, as pernas dobradas, os braços estendidos, as mãos abertas, Gaetaninho ficou pronto para a defesa.
– Passa pro Beppino!
Beppino deu dois passos e meteu o pé na
bola. Com todo o muque. Ela cobriu o guardião sardento e foi parar no meio da rua.
– Vá dar tiro no inferno!
– Cala a bôca, palestrino!
– Traga a bola!
Gaetaninho saiu correndo. Antes de alcançar a bola um bonde o pegou. Pegou e matou.
No bonde vinha o pai de Gaetaninho. A gurisada assustada espalhou a notícia na noite.
– Sabe o Gaetaninho?
– Que é que tem?
– Amassou o bonde!
A vizinhança limpou com benzina suas roupas domingueiras.
Às dezesseis horas do dia seguinte saiu um entêrro da Rua do Oriente e Gaetaninho não ia na boleia de nenhum dos carros do acompanhamento. Ia no da frente dentro de um caixão fechado com flores pobres por cima. Vestia a roupa marinheira, tinha as ligas, mas não levava a palhetinha.
Quem na boleia de um dos carros do cortejo mirim exibia soberbo terno vermelho que feria a vista da gente era o Beppino.
*A grafia das palavras foi mantida tal qual na obra original. MACHADO, Antônio de Alcântara. Gaetaninho. In: Brás, Bexiga e Barra Funda. Notícias de São Paulo. Belo Horizonte: Garnier, 2002. p. 23-29.
Acerca do texto “Gaetaninho” e de sua incorporação às ideias modernistas de primeira fase, assinale a alternativa correta, a seguir.
Leia o conto de Antônio de Alcântara Machado para responder a questão.
Gaetaninho
– Chi, Gaetaninho, como é bom!
Gaetaninho ficou banzando bem no meio da rua. O Ford quási o derrubou e êle não viu o Ford. O carroceiro disse um palavrão e êle não ouviu o palavrão.
– Eh! Gaetaninho! Vem pra dentro.
Grito materno sim: até filho surdo escuta. Virou o rosto tão feio de sardento, viu a mãe e viu o chinelo.
– Subito!
Foi-se chegando devagarinho, devagarinho. Fazendo beicinho. Estudando o terreno. Deante da mãe e do chinelo parou. Balançou o corpo. Recurso de campeão de futebol. Fingiu tomar a direita. Mas deu meia volta instantânea e varou pela esquerda porta a dentro.
Eta salame de mestre!
Ali na Rua Oriente a ralé quando muito andava de bonde. De automóvel ou carro só mesmo em dia de entêrro. De entêrro ou de casamento. Por isso mesmo o sonho de Gaetaninho era de realização muito difícil. Um sonho.
O Beppino por exemplo. O Beppino naquela tarde atravessara de carro a cidade. Mas como? Atrás da Tia Peronetta que se mudava para o Araçá. Assim também não era vantagem.
Mas se era o único meio? Paciência.
Gaetaninho enfiou a cabeça em baixo do travesseiro.
Que beleza , rapaz! Na frente quatro cavalos pretos empenachados levavam a tia Filomena para o cemitério. Depois o padre. Depois o Savério noivo dela de lenço nos olhos. Depois êle. Na boléia do carro. Ao lado do cocheiro. Com a roupa marinheira e o gorro branco onde se lia: Encouraçado São Paulo. Não. Ficava mais bonito de roupa marinheira mas com a palhetinha nova que o irmão lhe trouxera da fábrica. E ligas pretas segurando as meias. Que beleza, rapaz! Dentro do carro o pai, os dois irmãos mais velhos (um de gravata vermelha, outro de gravata verde) e o padrinho seu Salomone. Muita gente nas calçadas, nas portas e nas janelas dos palacetes, vendo o entêrro. Sobretudo admirando o Gaetaninho.
Mas Gaetaninho ainda não estava satisfeito. Queira ir carregando o chicote. O desgraçado do cocheiro não queria deixar. Nem por um instantinho só.
Gaetaninho ia berrar mas a tia Filomena com mania de cantar o Ahi, Mari! todas as manhãs o acordou.
Primeiro ficou desapontado. Depois quási chorou de ódio.
Tia Filomena teve um ataque de nervos quando soube do sonho de Gaetaninho. Tão forte que êle sentiu remorsos. E para sossêgo da família alarmada com o agouro tratou logo de substituir a tia por outra pessoa numa nova versão de seu sonho. Matutou, matutou e escolheu o acendedor da Companhia de Gás, seu Rubino, que uma vez lhe deu um cocre danado de doído.
Os irmãos (êsses) quando souberam da história resolveram arriscar de sociedade quinhentão no elefante. Deu a vaca. E êles ficaram loucos de raiva por não haverem logo adivinhado que não podia deixar de dar a vaca mesmo.
O jôgo na calçada parecia de vida ou morte. Muito embora Gaetaninho não estava ligando.
– Você conhecia o pai do Afonso, Beppino?
– Meu pai deu uma vez na cara dêle.
– Então você não vai amanhã no enterro. Eu vou!
O Vicente protestou indignado:
– Assim não jogo mais! O Gaetaninho está atrapalhando!
Gaetaninho voltou para o seu posto de guardião. Tão cheio de responsabilidades.
O Nino veio correndo com a bolinha de meia. Chegou bem perto. Com o tronco arqueado, as pernas dobradas, os braços estendidos, as mãos abertas, Gaetaninho ficou pronto para a defesa.
– Passa pro Beppino!
Beppino deu dois passos e meteu o pé na
bola. Com todo o muque. Ela cobriu o guardião sardento e foi parar no meio da rua.
– Vá dar tiro no inferno!
– Cala a bôca, palestrino!
– Traga a bola!
Gaetaninho saiu correndo. Antes de alcançar a bola um bonde o pegou. Pegou e matou.
No bonde vinha o pai de Gaetaninho. A gurisada assustada espalhou a notícia na noite.
– Sabe o Gaetaninho?
– Que é que tem?
– Amassou o bonde!
A vizinhança limpou com benzina suas roupas domingueiras.
Às dezesseis horas do dia seguinte saiu um entêrro da Rua do Oriente e Gaetaninho não ia na boleia de nenhum dos carros do acompanhamento. Ia no da frente dentro de um caixão fechado com flores pobres por cima. Vestia a roupa marinheira, tinha as ligas, mas não levava a palhetinha.
Quem na boleia de um dos carros do cortejo mirim exibia soberbo terno vermelho que feria a vista da gente era o Beppino.
*A grafia das palavras foi mantida tal qual na obra original. MACHADO, Antônio de Alcântara. Gaetaninho. In: Brás, Bexiga e Barra Funda. Notícias de São Paulo. Belo Horizonte: Garnier, 2002. p. 23-29.
Rodrigo de Andrade comenta a respeito do conto “Gaetaninho” e da obra que o contém: “Não é só esse desfecho trágico de Gaetaninho que não se esquece mais. É um pedaço pitoresco de bairro italiano. Um pedaço de vida. [...] A forma do sr. Antonio de Alcântara Machado é sua só. Não se sente nele a influência de ninguém. Neste livro novo mais do que no anterior seu estilo é preciso, direto, conciso. Não tem a preocupação de ser moderno. E é. Intensamente.”
(Andrade, Rodrigo M. F. de. Vida Literária. Antonio de Alcântara Machado. In: Brás, Bexiga e Barra Funda. Notícias de São Paulo. Belo Horizonte: Garnier, 2002. p. 95.)
Analise as sentenças seguintes sobre o conto, sob as luzes do comentário de Rodrigo de Andrade e atribua como julgamentos: Falsa F ou Verdadeira V.
1. A linguagem utilizada corresponde ao paradigma moderno de proximidade entre a língua oral e a língua escrita.
2. Há na narrativa a utilização de tempo psicológico, largamente empregado nas produções literárias do Modernismo.
3. Os índices de modernidade podem ser percebidos por meio de elementos como carro, bonde e a figura do acendedor da Companhia de Gás
4. O início do texto: “– Chi, Gaetaninho, como é bom!”, em forma de diálogo, é um recurso estilístico utilizado no gênero dramático, por isso pode-se dizer que “Gaetaninho” é uma produção literária dramática, com resquícios líricos.
5. A menção ao “jogo do bicho” permite dizer que o autor fez, no conto, apologia a jogos de azar, que eram proibidos na época em que foi publicado o conto.
6. Os nomes de personagens utilizados são típicos da cultura brasileira.
7. A presença de linguagem vulgar, adequada aos personagens representados, com xingamentos e metáforas que conotam humor negro está de acordo com o projeto estético, tanto quanto com o ideológico do Modernismo de primeira geração: aproximar a literatura das classes populares.
8. O espaço narrativo evidenciado na narrativa faz alusão à paradigmas clássicos, já que trata de temática universal: a morte.
9. A incorporação linguística de termos da cultura imigrante revela uma das características do Modernismo de primeira fase: a busca de uma identidade nacional.
10. O texto, em sua totalidade, apresenta-se no tempo pretérito, mantendo a tradição, já que é uma espécie derivada do gênero épico.
A alternativa que contempla a sequência correta dos julgamentos das afirmações é:
Leia o conto de Antônio de Alcântara Machado para responder a questão.
Gaetaninho
– Chi, Gaetaninho, como é bom!
Gaetaninho ficou banzando bem no meio da rua. O Ford quási o derrubou e êle não viu o Ford. O carroceiro disse um palavrão e êle não ouviu o palavrão.
– Eh! Gaetaninho! Vem pra dentro.
Grito materno sim: até filho surdo escuta. Virou o rosto tão feio de sardento, viu a mãe e viu o chinelo.
– Subito!
Foi-se chegando devagarinho, devagarinho. Fazendo beicinho. Estudando o terreno. Deante da mãe e do chinelo parou. Balançou o corpo. Recurso de campeão de futebol. Fingiu tomar a direita. Mas deu meia volta instantânea e varou pela esquerda porta a dentro.
Eta salame de mestre!
Ali na Rua Oriente a ralé quando muito andava de bonde. De automóvel ou carro só mesmo em dia de entêrro. De entêrro ou de casamento. Por isso mesmo o sonho de Gaetaninho era de realização muito difícil. Um sonho.
O Beppino por exemplo. O Beppino naquela tarde atravessara de carro a cidade. Mas como? Atrás da Tia Peronetta que se mudava para o Araçá. Assim também não era vantagem.
Mas se era o único meio? Paciência.
Gaetaninho enfiou a cabeça em baixo do travesseiro.
Que beleza , rapaz! Na frente quatro cavalos pretos empenachados levavam a tia Filomena para o cemitério. Depois o padre. Depois o Savério noivo dela de lenço nos olhos. Depois êle. Na boléia do carro. Ao lado do cocheiro. Com a roupa marinheira e o gorro branco onde se lia: Encouraçado São Paulo. Não. Ficava mais bonito de roupa marinheira mas com a palhetinha nova que o irmão lhe trouxera da fábrica. E ligas pretas segurando as meias. Que beleza, rapaz! Dentro do carro o pai, os dois irmãos mais velhos (um de gravata vermelha, outro de gravata verde) e o padrinho seu Salomone. Muita gente nas calçadas, nas portas e nas janelas dos palacetes, vendo o entêrro. Sobretudo admirando o Gaetaninho.
Mas Gaetaninho ainda não estava satisfeito. Queira ir carregando o chicote. O desgraçado do cocheiro não queria deixar. Nem por um instantinho só.
Gaetaninho ia berrar mas a tia Filomena com mania de cantar o Ahi, Mari! todas as manhãs o acordou.
Primeiro ficou desapontado. Depois quási chorou de ódio.
Tia Filomena teve um ataque de nervos quando soube do sonho de Gaetaninho. Tão forte que êle sentiu remorsos. E para sossêgo da família alarmada com o agouro tratou logo de substituir a tia por outra pessoa numa nova versão de seu sonho. Matutou, matutou e escolheu o acendedor da Companhia de Gás, seu Rubino, que uma vez lhe deu um cocre danado de doído.
Os irmãos (êsses) quando souberam da história resolveram arriscar de sociedade quinhentão no elefante. Deu a vaca. E êles ficaram loucos de raiva por não haverem logo adivinhado que não podia deixar de dar a vaca mesmo.
O jôgo na calçada parecia de vida ou morte. Muito embora Gaetaninho não estava ligando.
– Você conhecia o pai do Afonso, Beppino?
– Meu pai deu uma vez na cara dêle.
– Então você não vai amanhã no enterro. Eu vou!
O Vicente protestou indignado:
– Assim não jogo mais! O Gaetaninho está atrapalhando!
Gaetaninho voltou para o seu posto de guardião. Tão cheio de responsabilidades.
O Nino veio correndo com a bolinha de meia. Chegou bem perto. Com o tronco arqueado, as pernas dobradas, os braços estendidos, as mãos abertas, Gaetaninho ficou pronto para a defesa.
– Passa pro Beppino!
Beppino deu dois passos e meteu o pé na
bola. Com todo o muque. Ela cobriu o guardião sardento e foi parar no meio da rua.
– Vá dar tiro no inferno!
– Cala a bôca, palestrino!
– Traga a bola!
Gaetaninho saiu correndo. Antes de alcançar a bola um bonde o pegou. Pegou e matou.
No bonde vinha o pai de Gaetaninho. A gurisada assustada espalhou a notícia na noite.
– Sabe o Gaetaninho?
– Que é que tem?
– Amassou o bonde!
A vizinhança limpou com benzina suas roupas domingueiras.
Às dezesseis horas do dia seguinte saiu um entêrro da Rua do Oriente e Gaetaninho não ia na boleia de nenhum dos carros do acompanhamento. Ia no da frente dentro de um caixão fechado com flores pobres por cima. Vestia a roupa marinheira, tinha as ligas, mas não levava a palhetinha.
Quem na boleia de um dos carros do cortejo mirim exibia soberbo terno vermelho que feria a vista da gente era o Beppino.
*A grafia das palavras foi mantida tal qual na obra original. MACHADO, Antônio de Alcântara. Gaetaninho. In: Brás, Bexiga e Barra Funda. Notícias de São Paulo. Belo Horizonte: Garnier, 2002. p. 23-29.
Observe as 5 frases enumeradas a seguir quanto às estruturas e significados e identifique a alternativa que contempla o conjunto das 5 afirmações completamente corretas acerca das frases conforme os respectivos números.
1. “O carroceiro disse um palavrão e êle não ouviu o palavrão.”
2. “Ficava mais bonito de roupa marinheira mas com a palhetinha nova que o irmão lhe trouxera da fábrica.”
3. “Tia Filomena teve um ataque de nervos quando soube do sonho de Gaetaninho.”
4. “Matutou, matutou e escolheu o acendedor da Companhia de Gás, seu Rubino, que uma vez lhe deu um cocre danado de doído.”
5. “Com o tronco arqueado, as pernas dobradas, os braços estendidos, as mãos abertas, Gaetaninho ficou pronto para a defesa.”
Leia o texto a seguir de Clarice Lispector para responder a questão.
Das vantagens de ser bobo
– O bobo, por não se ocupar com ambições, tem tempo para ver, ouvir e tocar no mundo.
– O bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado por que não faz alguma coisa, responde: “Estou fazendo. Estou pensando.”
– Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem a ideia.
– O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não veem.
– Os espertos estão sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e estes os veem como simples pessoas humanas.
– O bobo ganha utilidade e sabedoria para viver.
– O bobo nunca parece ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é um Dostoievski.
– Há desvantagem, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou na palavra de um desconhecido para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é fresco. Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer. Resultado: não funciona. Chamado um técnico, a opinião deste era de que o aparelho estava tão estragado que o conserto seria caríssimo: mais valia comprar outro.
– Mas, em contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e portanto estar tranquilo. Enquanto o esperto não dorme à noite com medo de ser ludibriado.
– O esperto vence com úlcera no estômago. O bobo não percebe que venceu.
– Aviso: não confundir bobos com burros.
– Desvantagem: pode receber uma punhalada de quem menos espera. É uma das tristezas que o bobo não prevê. César terminou dizendo a frase célebre: “Até tu, Brutus?"
– Bobo não reclama. Em compensação, como exclama!
– Os bobos, com todas as suas palhaçadas, devem estar todos no céu.
– Se Cristo tivesse sido esperto não teria morrido na cruz.
– O bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem passar por bobos.
– Ser bobo é uma criatividade e, como toda criação, é difícil. Por isso é que os espertos não conseguem passar por bobos.
– Os espertos ganham dos outros. Em compensação os bobos ganham vida.
– Bem-aventurados os bobos porque sabem sem que ninguém desconfie. Aliás não se importam que saibam que eles sabem.
– Há lugares que facilitam mais as pessoas serem bobas (não confundir bobo com burro, com tolo, com fútil). Minas Gerais, por exemplo, facilita o ser bobo. Ah, quantos perdem por não nascer em Minas!
– Bobo é Chagall, que põe vaca no espaço, voando por cima das casas.
– É quase impossível evitar o excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo.
LISPECTOR, Clarice. Das vantagens de ser bobo. In: Clarice na cabeceira. Crônicas. Rio de Janeiro: Rocco, 2010. p. 53- 55.
Examine as seguintes sentenças a respeito da crônica “Das vantagens de ser bobo”.
1. Embora seja uma crônica, texto em que predomina o discurso indireto, a estrutura apresentada é de um diálogo, o que pode ser comprovado pela presença do travessão.
2. A falta de ambição do bobo o predispõe ao exercício de percepções sensoriais.
3. O bobo pode ser caracterizado como alguém sem autenticidade e autonomia, já que não tem opiniões próprias, como se vê em: “Estou fazendo. Estou pensando”.
4. A originalidade e a espontaneidade do bobo fazem com que ele se perca em infinitas possibilidades.
5. Os espertos são mais seletivos e, por isso, veem menos coisas que os bobos.
6. Os bobos, muitas vezes, passam desapercebidos pelos espertos, pois estes são concebidos por aqueles como simplórios.
7. A fala: “– O bobo ganha liberdade e sabedoria para viver.” pode ser substituída pela expressão popular “É um inocente útil”, com prejuízo de sentido.
8. O texto apresenta uma única desvantagem de ser bobo.
9. Segundo o texto, “não desconfiar” e “ter boa fé” propiciam boas noites de sono.
10. O texto faz referência a personagens do cotidiano.
A alternativa que contempla a soma das sentenças incorretas é:
Leia o texto a seguir de Clarice Lispector para responder a questão.
Das vantagens de ser bobo
– O bobo, por não se ocupar com ambições, tem tempo para ver, ouvir e tocar no mundo.
– O bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado por que não faz alguma coisa, responde: “Estou fazendo. Estou pensando.”
– Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem a ideia.
– O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não veem.
– Os espertos estão sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e estes os veem como simples pessoas humanas.
– O bobo ganha utilidade e sabedoria para viver.
– O bobo nunca parece ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é um Dostoievski.
– Há desvantagem, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou na palavra de um desconhecido para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é fresco. Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer. Resultado: não funciona. Chamado um técnico, a opinião deste era de que o aparelho estava tão estragado que o conserto seria caríssimo: mais valia comprar outro.
– Mas, em contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e portanto estar tranquilo. Enquanto o esperto não dorme à noite com medo de ser ludibriado.
– O esperto vence com úlcera no estômago. O bobo não percebe que venceu.
– Aviso: não confundir bobos com burros.
– Desvantagem: pode receber uma punhalada de quem menos espera. É uma das tristezas que o bobo não prevê. César terminou dizendo a frase célebre: “Até tu, Brutus?"
– Bobo não reclama. Em compensação, como exclama!
– Os bobos, com todas as suas palhaçadas, devem estar todos no céu.
– Se Cristo tivesse sido esperto não teria morrido na cruz.
– O bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem passar por bobos.
– Ser bobo é uma criatividade e, como toda criação, é difícil. Por isso é que os espertos não conseguem passar por bobos.
– Os espertos ganham dos outros. Em compensação os bobos ganham vida.
– Bem-aventurados os bobos porque sabem sem que ninguém desconfie. Aliás não se importam que saibam que eles sabem.
– Há lugares que facilitam mais as pessoas serem bobas (não confundir bobo com burro, com tolo, com fútil). Minas Gerais, por exemplo, facilita o ser bobo. Ah, quantos perdem por não nascer em Minas!
– Bobo é Chagall, que põe vaca no espaço, voando por cima das casas.
– É quase impossível evitar o excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo.
LISPECTOR, Clarice. Das vantagens de ser bobo. In: Clarice na cabeceira. Crônicas. Rio de Janeiro: Rocco, 2010. p. 53- 55.
Analise as sentenças abaixo e julgue-as por meio dos sinais C para corretas e I para incorretas.
1. A palavra “aviso” pode ser substituída pelo vocábulo “advertência”, sem prejuízo de significação.
2. No trecho “César terminou dizendo a frase célebre: “Até tu, Brutus?”, a autora faz menção à eloquência e à capacidade perquiritória de César, que segundo fatos históricos, utilizava a “maiêutica socrática” com seus interlocutores.
3. Na passagem “Enquanto o esperto não dorme à noite com medo de ser ludibriado.”, o termo “Enquanto”, no contexto, exerce função de proporcionalidade de juízo de valores opostos.
4. Em “– Aviso: não confundir bobos com burros.”, há atividade transgênero, ou seja, determinadas características de um gênero, no caso, placas de interdição, foram incorporadas pelo gênero crônica.
5. O texto, utilizando um termo condicional, afirma indiretamente que Jesus Cristo foi um bobo.
6. Segundo as normas da língua padrão, em “há espertos que se fazem passar por bobos.”, “há” está empregado de forma inadequada.
7. O texto afirma diretamente que os espertos não são criativos.
8. Em determinado momento do texto, a vantagem de ganhar em “ganham” contempla tanto os espertos quanto os bobos.
9. “Aliás”, em “Aliás não se importam (...)”, denota sentido causal.
10. Clarice Lispector encerra o texto com foco na incondicionalidade do amor.
A alternativa que corresponde à análise é: