UPF 2015 Inverno
79 Questões
Cidade sem catracas
A qualidade de uma cidade se mede pelo tamanho de suas calçadas. Nunca mais tirei essa frase da cabeça
depois que a ouvi de um urbanista.
Sempre tive um enorme prazer em flanar pelas cidades, sem guias nem roteiros, apenas pelo gosto de
descobrir novidades, como se eu fosse um menino brincando de caça ao tesouro. Algumas das imagens mais fortes
[5] que surgem de Roma, Paris, Nova York, Amsterdã ou Londres não são seus pontos turísticos obrigatórios – mas as
emoções nascidas das pequenas descobertas do flanar.
Nasci em São Paulo, onde, menino, brincava nas ruas e, despreocupado, fazia caminhadas pelo centro.
Naquele tempo, o centro parecia um parque de diversão, com seus cinemas, teatros, livrarias, sebos, praças alegres.
Meu pai tinha uma loja nas redondezas, um porto seguro.
[10] As calçadas são, porém, um símbolo de convivência. O desaparecimento das calçadas paulistanas,
devoradas pelos automóveis, é reflexo da forma de perceber o cidadão em seu território. Está aí, em essência, a
cidadania. Há toda uma carga ideológica, muito mais do que uma simples questão de trânsito, a prioridade ao
automóvel – é o sinal de que o individual suplanta o coletivo.
A cidade deixa de gerar o senso de pertencimento. Não provoca identidade. Tudo está em permanente
[15] destruição da memória. Isso se traduz em ressentimento e o ressentimento em falta de cuidado. Se tivéssemos de
criar um manual sobre como não cuidar de uma cidade, São Paulo seria um caso perfeito. O resultado está aí: as
pessoas trancadas em seus carros, nas suas casas, nos condomínios, nos shoppings. Todos estão cercados por
catracas. É a modernidade dentro da barbárie urbana.
Quem pode sai correndo o mais rapidamente. Nos finais de semana, corre para a praia ou campo. Outros
[20] preferem pichá-la dos mais diferentes jeitos – as letras nos prédios são as mais visíveis.
Minha visão de cidade é mesmo a das calçadas largas. Mas não são apenas as de concreto. Civilidade é
permitir o máximo possível o encontro e a aprendizagem. Grandes cidades são aquelas que se transformam em
comunidades de aprendizagem, onde aprendemos em todos os lugares, a começar da rua. Não é por acaso que o
apogeu de um país está associado a cidades que exibem efervescência cultural. E os arquitetos, intuitivamente,
[25] tentam moldar a cidade ao encontro coletivo. É o que vemos desde as praças atenienses. Justamente por isso,
quando se criou a Virada Cultural, naturalmente se arquitetou a ocupação das ruas em São Paulo – e, em especial,
das ruas do centro. O grande valor das grandes cidades é esse de colocar os talentos aprendendo e compartilhando.
Daí ser um polo de atração dos inovadores e transgressores. A renascença precisava de uma Florença, o jazz de
Nova York, o rock de Londres, a psicanálise de Viena, o cubismo de Paris, a bossa nova do Rio, a semana de arte
[30] moderna de São Paulo, o tango de Buenos Aires. Na era da informação, as calçadas têm mais um significado
especial. E, para mim, o mais importante dos significados: a cidade educadora. Imagina-se, em geral, que o papel
de educar é das escolas e da família.
A cidade educadora amplia esse conceito – e, aí, misturam-se educação, cultura, formando uma única
linguagem, colada pelas novas tecnologias de comunicação. Museus, empresas, escolas, universidades, praças,
[35] parques, bibliotecas, cinemas, teatros, salas de concertos. Aprende-se em qualquer lugar e a qualquer hora. O
espaço público não ameaça, congrega. Não violenta, ensina. Não afasta, aproxima. Não produz muros, produz
jardins. Daí que, nos últimos 13 anos, tenho participado, em São Paulo, da experiência do bairro-escola, comandado
pela Cidade Escola Aprendiz, desenvolvida inicialmente na Vila Madalena. A ideia, singela, é de que o bairro seja
uma extensão da casa – e o bairro e a casa sejam uma extensão da escola.
[40] Está aí minha utopia: uma cidade sem catracas.
(DIMENSTEIN, Gilberto. Uma cidade sem catracas. Acesso, o blog da democratização cultural. Disponível em: http://www.blogacesso.com.br/?p=2639. Acesso em 3 abr. 2015)
O texto defende um ponto de vista global, segundo o qual:
Cidade sem catracas
A qualidade de uma cidade se mede pelo tamanho de suas calçadas. Nunca mais tirei essa frase da cabeça
depois que a ouvi de um urbanista.
Sempre tive um enorme prazer em flanar pelas cidades, sem guias nem roteiros, apenas pelo gosto de
descobrir novidades, como se eu fosse um menino brincando de caça ao tesouro. Algumas das imagens mais fortes
[5] que surgem de Roma, Paris, Nova York, Amsterdã ou Londres não são seus pontos turísticos obrigatórios – mas as
emoções nascidas das pequenas descobertas do flanar.
Nasci em São Paulo, onde, menino, brincava nas ruas e, despreocupado, fazia caminhadas pelo centro.
Naquele tempo, o centro parecia um parque de diversão, com seus cinemas, teatros, livrarias, sebos, praças alegres.
Meu pai tinha uma loja nas redondezas, um porto seguro.
[10] As calçadas são, porém, um símbolo de convivência. O desaparecimento das calçadas paulistanas,
devoradas pelos automóveis, é reflexo da forma de perceber o cidadão em seu território. Está aí, em essência, a
cidadania. Há toda uma carga ideológica, muito mais do que uma simples questão de trânsito, a prioridade ao
automóvel – é o sinal de que o individual suplanta o coletivo.
A cidade deixa de gerar o senso de pertencimento. Não provoca identidade. Tudo está em permanente
[15] destruição da memória. Isso se traduz em ressentimento e o ressentimento em falta de cuidado. Se tivéssemos de
criar um manual sobre como não cuidar de uma cidade, São Paulo seria um caso perfeito. O resultado está aí: as
pessoas trancadas em seus carros, nas suas casas, nos condomínios, nos shoppings. Todos estão cercados por
catracas. É a modernidade dentro da barbárie urbana.
Quem pode sai correndo o mais rapidamente. Nos finais de semana, corre para a praia ou campo. Outros
[20] preferem pichá-la dos mais diferentes jeitos – as letras nos prédios são as mais visíveis.
Minha visão de cidade é mesmo a das calçadas largas. Mas não são apenas as de concreto. Civilidade é
permitir o máximo possível o encontro e a aprendizagem. Grandes cidades são aquelas que se transformam em
comunidades de aprendizagem, onde aprendemos em todos os lugares, a começar da rua. Não é por acaso que o
apogeu de um país está associado a cidades que exibem efervescência cultural. E os arquitetos, intuitivamente,
[25] tentam moldar a cidade ao encontro coletivo. É o que vemos desde as praças atenienses. Justamente por isso,
quando se criou a Virada Cultural, naturalmente se arquitetou a ocupação das ruas em São Paulo – e, em especial,
das ruas do centro. O grande valor das grandes cidades é esse de colocar os talentos aprendendo e compartilhando.
Daí ser um polo de atração dos inovadores e transgressores. A renascença precisava de uma Florença, o jazz de
Nova York, o rock de Londres, a psicanálise de Viena, o cubismo de Paris, a bossa nova do Rio, a semana de arte
[30] moderna de São Paulo, o tango de Buenos Aires. Na era da informação, as calçadas têm mais um significado
especial. E, para mim, o mais importante dos significados: a cidade educadora. Imagina-se, em geral, que o papel
de educar é das escolas e da família.
A cidade educadora amplia esse conceito – e, aí, misturam-se educação, cultura, formando uma única
linguagem, colada pelas novas tecnologias de comunicação. Museus, empresas, escolas, universidades, praças,
[35] parques, bibliotecas, cinemas, teatros, salas de concertos. Aprende-se em qualquer lugar e a qualquer hora. O
espaço público não ameaça, congrega. Não violenta, ensina. Não afasta, aproxima. Não produz muros, produz
jardins. Daí que, nos últimos 13 anos, tenho participado, em São Paulo, da experiência do bairro-escola, comandado
pela Cidade Escola Aprendiz, desenvolvida inicialmente na Vila Madalena. A ideia, singela, é de que o bairro seja
uma extensão da casa – e o bairro e a casa sejam uma extensão da escola.
[40] Está aí minha utopia: uma cidade sem catracas.
(DIMENSTEIN, Gilberto. Uma cidade sem catracas. Acesso, o blog da democratização cultural. Disponível em: http://www.blogacesso.com.br/?p=2639. Acesso em 3 abr. 2015)
O texto se organiza a partir de diferentes recursos argumentativos. Em relação a isso, observe os segmentos I e II.
I. “Sempre tive um enorme prazer em flanar pelas cidades, sem guias nem roteiros, apenas pelo gosto de descobrir novidades, como se eu fosse um menino brincando de caça ao tesouro”. (linhas 3 e 4)
II. “Daí que, nos últimos 13 anos, tenho participado, em São Paulo, da experiência do bairro-escola, comandado pela Cidade Escola Aprendiz, desenvolvida inicialmente na Vila Madalena”. (linhas 37 e 38)
Analise as afirmações a seguir e assinale com V as verdadeiras e
com F as falsas.
( ) Os segmentos I e II se caracterizam pelo uso da primeira pessoa como recurso de subjetividade na argumentação do texto.
( ) O segmento I constrói o sentido pretendido a partir de uma comparação.
( ) O segmento II, por meio de exemplificação, reveste de concretude os argumentos apresentados no texto, num movimento que vai do geral para o específico.
A sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima para baixo, é:
Cidade sem catracas
A qualidade de uma cidade se mede pelo tamanho de suas calçadas. Nunca mais tirei essa frase da cabeça
depois que a ouvi de um urbanista.
Sempre tive um enorme prazer em flanar pelas cidades, sem guias nem roteiros, apenas pelo gosto de
descobrir novidades, como se eu fosse um menino brincando de caça ao tesouro. Algumas das imagens mais fortes
[5] que surgem de Roma, Paris, Nova York, Amsterdã ou Londres não são seus pontos turísticos obrigatórios – mas as
emoções nascidas das pequenas descobertas do flanar.
Nasci em São Paulo, onde, menino, brincava nas ruas e, despreocupado, fazia caminhadas pelo centro.
Naquele tempo, o centro parecia um parque de diversão, com seus cinemas, teatros, livrarias, sebos, praças alegres.
Meu pai tinha uma loja nas redondezas, um porto seguro.
[10] As calçadas são, porém, um símbolo de convivência. O desaparecimento das calçadas paulistanas,
devoradas pelos automóveis, é reflexo da forma de perceber o cidadão em seu território. Está aí, em essência, a
cidadania. Há toda uma carga ideológica, muito mais do que uma simples questão de trânsito, a prioridade ao
automóvel – é o sinal de que o individual suplanta o coletivo.
A cidade deixa de gerar o senso de pertencimento. Não provoca identidade. Tudo está em permanente
[15] destruição da memória. Isso se traduz em ressentimento e o ressentimento em falta de cuidado. Se tivéssemos de
criar um manual sobre como não cuidar de uma cidade, São Paulo seria um caso perfeito. O resultado está aí: as
pessoas trancadas em seus carros, nas suas casas, nos condomínios, nos shoppings. Todos estão cercados por
catracas. É a modernidade dentro da barbárie urbana.
Quem pode sai correndo o mais rapidamente. Nos finais de semana, corre para a praia ou campo. Outros
[20] preferem pichá-la dos mais diferentes jeitos – as letras nos prédios são as mais visíveis.
Minha visão de cidade é mesmo a das calçadas largas. Mas não são apenas as de concreto. Civilidade é
permitir o máximo possível o encontro e a aprendizagem. Grandes cidades são aquelas que se transformam em
comunidades de aprendizagem, onde aprendemos em todos os lugares, a começar da rua. Não é por acaso que o
apogeu de um país está associado a cidades que exibem efervescência cultural. E os arquitetos, intuitivamente,
[25] tentam moldar a cidade ao encontro coletivo. É o que vemos desde as praças atenienses. Justamente por isso,
quando se criou a Virada Cultural, naturalmente se arquitetou a ocupação das ruas em São Paulo – e, em especial,
das ruas do centro. O grande valor das grandes cidades é esse de colocar os talentos aprendendo e compartilhando.
Daí ser um polo de atração dos inovadores e transgressores. A renascença precisava de uma Florença, o jazz de
Nova York, o rock de Londres, a psicanálise de Viena, o cubismo de Paris, a bossa nova do Rio, a semana de arte
[30] moderna de São Paulo, o tango de Buenos Aires. Na era da informação, as calçadas têm mais um significado
especial. E, para mim, o mais importante dos significados: a cidade educadora. Imagina-se, em geral, que o papel
de educar é das escolas e da família.
A cidade educadora amplia esse conceito – e, aí, misturam-se educação, cultura, formando uma única
linguagem, colada pelas novas tecnologias de comunicação. Museus, empresas, escolas, universidades, praças,
[35] parques, bibliotecas, cinemas, teatros, salas de concertos. Aprende-se em qualquer lugar e a qualquer hora. O
espaço público não ameaça, congrega. Não violenta, ensina. Não afasta, aproxima. Não produz muros, produz
jardins. Daí que, nos últimos 13 anos, tenho participado, em São Paulo, da experiência do bairro-escola, comandado
pela Cidade Escola Aprendiz, desenvolvida inicialmente na Vila Madalena. A ideia, singela, é de que o bairro seja
uma extensão da casa – e o bairro e a casa sejam uma extensão da escola.
[40] Está aí minha utopia: uma cidade sem catracas.
(DIMENSTEIN, Gilberto. Uma cidade sem catracas. Acesso, o blog da democratização cultural. Disponível em: http://www.blogacesso.com.br/?p=2639. Acesso em 3 abr. 2015)
Assinale a alternativa que contém a única oposição não explorada tematicamente pelo texto.
Cidade sem catracas
A qualidade de uma cidade se mede pelo tamanho de suas calçadas. Nunca mais tirei essa frase da cabeça
depois que a ouvi de um urbanista.
Sempre tive um enorme prazer em flanar pelas cidades, sem guias nem roteiros, apenas pelo gosto de
descobrir novidades, como se eu fosse um menino brincando de caça ao tesouro. Algumas das imagens mais fortes
[5] que surgem de Roma, Paris, Nova York, Amsterdã ou Londres não são seus pontos turísticos obrigatórios – mas as
emoções nascidas das pequenas descobertas do flanar.
Nasci em São Paulo, onde, menino, brincava nas ruas e, despreocupado, fazia caminhadas pelo centro.
Naquele tempo, o centro parecia um parque de diversão, com seus cinemas, teatros, livrarias, sebos, praças alegres.
Meu pai tinha uma loja nas redondezas, um porto seguro.
[10] As calçadas são, porém, um símbolo de convivência. O desaparecimento das calçadas paulistanas,
devoradas pelos automóveis, é reflexo da forma de perceber o cidadão em seu território. Está aí, em essência, a
cidadania. Há toda uma carga ideológica, muito mais do que uma simples questão de trânsito, a prioridade ao
automóvel – é o sinal de que o individual suplanta o coletivo.
A cidade deixa de gerar o senso de pertencimento. Não provoca identidade. Tudo está em permanente
[15] destruição da memória. Isso se traduz em ressentimento e o ressentimento em falta de cuidado. Se tivéssemos de
criar um manual sobre como não cuidar de uma cidade, São Paulo seria um caso perfeito. O resultado está aí: as
pessoas trancadas em seus carros, nas suas casas, nos condomínios, nos shoppings. Todos estão cercados por
catracas. É a modernidade dentro da barbárie urbana.
Quem pode sai correndo o mais rapidamente. Nos finais de semana, corre para a praia ou campo. Outros
[20] preferem pichá-la dos mais diferentes jeitos – as letras nos prédios são as mais visíveis.
Minha visão de cidade é mesmo a das calçadas largas. Mas não são apenas as de concreto. Civilidade é
permitir o máximo possível o encontro e a aprendizagem. Grandes cidades são aquelas que se transformam em
comunidades de aprendizagem, onde aprendemos em todos os lugares, a começar da rua. Não é por acaso que o
apogeu de um país está associado a cidades que exibem efervescência cultural. E os arquitetos, intuitivamente,
[25] tentam moldar a cidade ao encontro coletivo. É o que vemos desde as praças atenienses. Justamente por isso,
quando se criou a Virada Cultural, naturalmente se arquitetou a ocupação das ruas em São Paulo – e, em especial,
das ruas do centro. O grande valor das grandes cidades é esse de colocar os talentos aprendendo e compartilhando.
Daí ser um polo de atração dos inovadores e transgressores. A renascença precisava de uma Florença, o jazz de
Nova York, o rock de Londres, a psicanálise de Viena, o cubismo de Paris, a bossa nova do Rio, a semana de arte
[30] moderna de São Paulo, o tango de Buenos Aires. Na era da informação, as calçadas têm mais um significado
especial. E, para mim, o mais importante dos significados: a cidade educadora. Imagina-se, em geral, que o papel
de educar é das escolas e da família.
A cidade educadora amplia esse conceito – e, aí, misturam-se educação, cultura, formando uma única
linguagem, colada pelas novas tecnologias de comunicação. Museus, empresas, escolas, universidades, praças,
[35] parques, bibliotecas, cinemas, teatros, salas de concertos. Aprende-se em qualquer lugar e a qualquer hora. O
espaço público não ameaça, congrega. Não violenta, ensina. Não afasta, aproxima. Não produz muros, produz
jardins. Daí que, nos últimos 13 anos, tenho participado, em São Paulo, da experiência do bairro-escola, comandado
pela Cidade Escola Aprendiz, desenvolvida inicialmente na Vila Madalena. A ideia, singela, é de que o bairro seja
uma extensão da casa – e o bairro e a casa sejam uma extensão da escola.
[40] Está aí minha utopia: uma cidade sem catracas.
(DIMENSTEIN, Gilberto. Uma cidade sem catracas. Acesso, o blog da democratização cultural. Disponível em: http://www.blogacesso.com.br/?p=2639. Acesso em 3 abr. 2015)
O texto se caracteriza pelo uso de diferentes figuras concretas. Acerca dessas figuras e do sentido que veiculam, é correto afirmar que:
Cidade sem catracas
A qualidade de uma cidade se mede pelo tamanho de suas calçadas. Nunca mais tirei essa frase da cabeça
depois que a ouvi de um urbanista.
Sempre tive um enorme prazer em flanar pelas cidades, sem guias nem roteiros, apenas pelo gosto de
descobrir novidades, como se eu fosse um menino brincando de caça ao tesouro. Algumas das imagens mais fortes
[5] que surgem de Roma, Paris, Nova York, Amsterdã ou Londres não são seus pontos turísticos obrigatórios – mas as
emoções nascidas das pequenas descobertas do flanar.
Nasci em São Paulo, onde, menino, brincava nas ruas e, despreocupado, fazia caminhadas pelo centro.
Naquele tempo, o centro parecia um parque de diversão, com seus cinemas, teatros, livrarias, sebos, praças alegres.
Meu pai tinha uma loja nas redondezas, um porto seguro.
[10] As calçadas são, porém, um símbolo de convivência. O desaparecimento das calçadas paulistanas,
devoradas pelos automóveis, é reflexo da forma de perceber o cidadão em seu território. Está aí, em essência, a
cidadania. Há toda uma carga ideológica, muito mais do que uma simples questão de trânsito, a prioridade ao
automóvel – é o sinal de que o individual suplanta o coletivo.
A cidade deixa de gerar o senso de pertencimento. Não provoca identidade. Tudo está em permanente
[15] destruição da memória. Isso se traduz em ressentimento e o ressentimento em falta de cuidado. Se tivéssemos de
criar um manual sobre como não cuidar de uma cidade, São Paulo seria um caso perfeito. O resultado está aí: as
pessoas trancadas em seus carros, nas suas casas, nos condomínios, nos shoppings. Todos estão cercados por
catracas. É a modernidade dentro da barbárie urbana.
Quem pode sai correndo o mais rapidamente. Nos finais de semana, corre para a praia ou campo. Outros
[20] preferem pichá-la dos mais diferentes jeitos – as letras nos prédios são as mais visíveis.
Minha visão de cidade é mesmo a das calçadas largas. Mas não são apenas as de concreto. Civilidade é
permitir o máximo possível o encontro e a aprendizagem. Grandes cidades são aquelas que se transformam em
comunidades de aprendizagem, onde aprendemos em todos os lugares, a começar da rua. Não é por acaso que o
apogeu de um país está associado a cidades que exibem efervescência cultural. E os arquitetos, intuitivamente,
[25] tentam moldar a cidade ao encontro coletivo. É o que vemos desde as praças atenienses. Justamente por isso,
quando se criou a Virada Cultural, naturalmente se arquitetou a ocupação das ruas em São Paulo – e, em especial,
das ruas do centro. O grande valor das grandes cidades é esse de colocar os talentos aprendendo e compartilhando.
Daí ser um polo de atração dos inovadores e transgressores. A renascença precisava de uma Florença, o jazz de
Nova York, o rock de Londres, a psicanálise de Viena, o cubismo de Paris, a bossa nova do Rio, a semana de arte
[30] moderna de São Paulo, o tango de Buenos Aires. Na era da informação, as calçadas têm mais um significado
especial. E, para mim, o mais importante dos significados: a cidade educadora. Imagina-se, em geral, que o papel
de educar é das escolas e da família.
A cidade educadora amplia esse conceito – e, aí, misturam-se educação, cultura, formando uma única
linguagem, colada pelas novas tecnologias de comunicação. Museus, empresas, escolas, universidades, praças,
[35] parques, bibliotecas, cinemas, teatros, salas de concertos. Aprende-se em qualquer lugar e a qualquer hora. O
espaço público não ameaça, congrega. Não violenta, ensina. Não afasta, aproxima. Não produz muros, produz
jardins. Daí que, nos últimos 13 anos, tenho participado, em São Paulo, da experiência do bairro-escola, comandado
pela Cidade Escola Aprendiz, desenvolvida inicialmente na Vila Madalena. A ideia, singela, é de que o bairro seja
uma extensão da casa – e o bairro e a casa sejam uma extensão da escola.
[40] Está aí minha utopia: uma cidade sem catracas.
(DIMENSTEIN, Gilberto. Uma cidade sem catracas. Acesso, o blog da democratização cultural. Disponível em: http://www.blogacesso.com.br/?p=2639. Acesso em 3 abr. 2015)
“O espaço público não ameaça, congrega. Não violenta, ensina. Não afasta, aproxima. Não produz muros, produz jardins.” (linhas 35 a 37).
Considere as seguintes asserções a respeito do segmento acima:
I. Há uma estrutura formada por períodos compostos por coordenação, pois as orações que constituem os períodos são estruturalmente independentes.
II. As orações de cada período estão interligadas por uma ideia de alternância.
III. A elipse caracteriza a construção dos períodos.
É correto o que se afirma em:
Cidade sem catracas
A qualidade de uma cidade se mede pelo tamanho de suas calçadas. Nunca mais tirei essa frase da cabeça
depois que a ouvi de um urbanista.
Sempre tive um enorme prazer em flanar pelas cidades, sem guias nem roteiros, apenas pelo gosto de
descobrir novidades, como se eu fosse um menino brincando de caça ao tesouro. Algumas das imagens mais fortes
[5] que surgem de Roma, Paris, Nova York, Amsterdã ou Londres não são seus pontos turísticos obrigatórios – mas as
emoções nascidas das pequenas descobertas do flanar.
Nasci em São Paulo, onde, menino, brincava nas ruas e, despreocupado, fazia caminhadas pelo centro.
Naquele tempo, o centro parecia um parque de diversão, com seus cinemas, teatros, livrarias, sebos, praças alegres.
Meu pai tinha uma loja nas redondezas, um porto seguro.
[10] As calçadas são, porém, um símbolo de convivência. O desaparecimento das calçadas paulistanas,
devoradas pelos automóveis, é reflexo da forma de perceber o cidadão em seu território. Está aí, em essência, a
cidadania. Há toda uma carga ideológica, muito mais do que uma simples questão de trânsito, a prioridade ao
automóvel – é o sinal de que o individual suplanta o coletivo.
A cidade deixa de gerar o senso de pertencimento. Não provoca identidade. Tudo está em permanente
[15] destruição da memória. Isso se traduz em ressentimento e o ressentimento em falta de cuidado. Se tivéssemos de
criar um manual sobre como não cuidar de uma cidade, São Paulo seria um caso perfeito. O resultado está aí: as
pessoas trancadas em seus carros, nas suas casas, nos condomínios, nos shoppings. Todos estão cercados por
catracas. É a modernidade dentro da barbárie urbana.
Quem pode sai correndo o mais rapidamente. Nos finais de semana, corre para a praia ou campo. Outros
[20] preferem pichá-la dos mais diferentes jeitos – as letras nos prédios são as mais visíveis.
Minha visão de cidade é mesmo a das calçadas largas. Mas não são apenas as de concreto. Civilidade é
permitir o máximo possível o encontro e a aprendizagem. Grandes cidades são aquelas que se transformam em
comunidades de aprendizagem, onde aprendemos em todos os lugares, a começar da rua. Não é por acaso que o
apogeu de um país está associado a cidades que exibem efervescência cultural. E os arquitetos, intuitivamente,
[25] tentam moldar a cidade ao encontro coletivo. É o que vemos desde as praças atenienses. Justamente por isso,
quando se criou a Virada Cultural, naturalmente se arquitetou a ocupação das ruas em São Paulo – e, em especial,
das ruas do centro. O grande valor das grandes cidades é esse de colocar os talentos aprendendo e compartilhando.
Daí ser um polo de atração dos inovadores e transgressores. A renascença precisava de uma Florença, o jazz de
Nova York, o rock de Londres, a psicanálise de Viena, o cubismo de Paris, a bossa nova do Rio, a semana de arte
[30] moderna de São Paulo, o tango de Buenos Aires. Na era da informação, as calçadas têm mais um significado
especial. E, para mim, o mais importante dos significados: a cidade educadora. Imagina-se, em geral, que o papel
de educar é das escolas e da família.
A cidade educadora amplia esse conceito – e, aí, misturam-se educação, cultura, formando uma única
linguagem, colada pelas novas tecnologias de comunicação. Museus, empresas, escolas, universidades, praças,
[35] parques, bibliotecas, cinemas, teatros, salas de concertos. Aprende-se em qualquer lugar e a qualquer hora. O
espaço público não ameaça, congrega. Não violenta, ensina. Não afasta, aproxima. Não produz muros, produz
jardins. Daí que, nos últimos 13 anos, tenho participado, em São Paulo, da experiência do bairro-escola, comandado
pela Cidade Escola Aprendiz, desenvolvida inicialmente na Vila Madalena. A ideia, singela, é de que o bairro seja
uma extensão da casa – e o bairro e a casa sejam uma extensão da escola.
[40] Está aí minha utopia: uma cidade sem catracas.
(DIMENSTEIN, Gilberto. Uma cidade sem catracas. Acesso, o blog da democratização cultural. Disponível em: http://www.blogacesso.com.br/?p=2639. Acesso em 3 abr. 2015)
O segmento “A renascença precisava de uma Florença, o jazz de Nova York, o rock de Londres, a psicanálise de Viena, o cubismo de Paris, a bossa nova do Rio, a semana de arte moderna de São Paulo, o tango de Buenos Aires.” (linhas 28 a 30) faz alusão a uma relação: