Texto 1
Torno a ver-vos, ó montes ; o destino
Aqui me torna a pôr nestes outeiros,
Onde um tempo os gabões deixei grosseiros
Pelo traje da Corte rico e fino.
Aqui estou entre Almendro, entre Corino,
Os meus fiéis, meus doces companheiros,
Vendo correr os míseros vaqueiros
Atrás do seu cansado desatino.
Se o bem desta choupana pode tanto,
Que chega a ter mais preço, e mais valia,
Que da Cidade o lisonjeiro encanto;
Aqui descanse a louca fantasia;
E o que até agora se tornava em pranto
Se converta em afetos de alegria.
(CLÁUDIO MANUEL DA COSTA – Clássicos Brasileiros, Seleção e notas de Péricles Eugênio da Silva Ramos, Rio de Janeiro, Ediouro, s/d).
Texto 2
Ai Nise amada! SE este meu tormento,
Se estes meus sentidíssimos gemidos
Lá no teu peito, lá nos teus ouvidos
Achar pudessem brando recolhimento;
Como alegre em servir-te, como atento
Meus votos a tributara agradecidos!
Por séculos de males bem sofridos
Trocara todo o meu contentamento.
Mas se na incontrastável, pedra dura
Do teu rigor não há correspondência,
Para os doces afetos de ternura;
Cesse de meus suspiros a veemência;
Que é fazer mais soberba a formosura
Adorar o rigor da resistência.
(Idem, Ibdem)
Sobre o autor
Cláudio Manuel da Costa (1729-1789), cujo pseudônimo árcade é Glauceste Satúrnio, nasceu nas proximidades da atual cidade de Mariana, Minas Gerais. Como quase todos os poetas de sua geração, estudou Direito em Portugal, de onde regressa, dedicando-se a seguir à profissão, além de ocupar vários cargos públicos de relevo na Capitania.
Envolvido na Conjuração Mineira, é preso em 1789. Acometido de profunda depressão, suicida-se nesse mesmo ano.
I- Em ambos os textos, o emprego de uma espécie literária de forma fixa, com rimas e métrica bem elaboradas, além do mesmo esquema de rimas, comprova o formalismo de que, de modo geral, se revestiu o Neoclassicismo (ou Arcadismo).
II – Apenas o texto I, revela, da maneira explícita, o bucolismo típico da poesia árcade, comprovado pelo emprego de vocábulos como “montes”, “outeiros”, “gabões”, que nos remetem à ambiência rural, campestre.
III – O tema desenvolvido no texto I é a fuga da cidade (“fugere urbem”); para a voz poética do texto a alegria de estar no campo supera o sofrimento que ele supunha existir no ambiente urbano.