TEXTO
Com licença poética
Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
[5] Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
[10] Mas, o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
[15] sua raiz vai ao meu avô.
Vai ser coxo na vida, é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.
PRADO, Adélia Prado. Com Licença Poética. In: PRADO, Adélia. Adélia Prado: Poesia reunida. 6. ed. São Paulo: Siciliano, 1996. p. 11.
O texto marca-se como gênero poema com versos livres (sem a necessidade de rimas ou de restrições métricas).
Para a composição desse texto, a autora selecionou predominantemente a tipologia textual