Cesariana
Na Roma antiga, já se nascia com o destino traçado. O bebê era posto no chão pela parteira e o pai o levantava em manifestação de reconhecimento como filho legítimo. Se o pai não fizesse isso, a criança era deixada na porta da casa ou num monturo público à disposição de qualquer um. Se a mãe quisesse ficar com o filho, já era meio caminho andado: salta um futuro escravo à romana! Os bebês que nasciam deformados eram abandonados ou afogados, sem nenhum ressentimento, sob a chancela da intelligentsia local. Veja só o preceito (i)moral do filósofo Sêneca: “É preciso separar o que é bom do que não pode servir para nada”.
Plutarco registrou que os pobres abandonavam os filhos “para não vê-los corrompidos por uma educação medíocre que os torne inaptos à dignidade e à qualidade”. Qualquer argumento servia de desculpa moral para o enjeitamento de um recém-nascido. Logo depois que Nero assassinou sua mãe, Agripina, um romano abandonou um bebê com um cartaz: “Não te crio com medo de que mates tua mãe”.
(....) Quando Júlio César, o famoso imperador assassinado, nasceu em 100 a.C., foi batizado assim: Caio Júlio César. O sobrenome da gens Julia – Caesar – já era usado desde 208 a.C., e sua origem é imprecisa. Para alguns veio de caesaries, cabeleira (longa e abundante); para outros, de caesus, particípio de caedere, cortar, e aí interpretado como “retirado do ventre por incisão”. Como o César que ganhou notoriedade foi o personagem shakespeariano, criou-se a lenda de que a palavra cesariana veio dele, que teria nascido dessa forma. Muito improvável: a mãe, Aurélia, viveu muitos anos após o nascimento do filho. A primeira cesariana documentada (numa mulher viva, é claro) foi realiada em 1610. A mãe? Morreu 25 dias depois.
(Do francês césarienne. Reinaldo Pimenta)
O cidadão romano que afirmou “Não te crio com medo de que mates tua mãe” apresentou um argumento para a defesa de sua posição de não querer criar o filho, mas esse argumento não é bom, porque