TEXTO – A saúde a um toque dos dedos
Sem saber, o epidemiologista bengalês Alain Labrique foi um dos pioneiros de uma revolução em curso na medicina que mudará para sempre a forma como médicos e pacientes gerenciam a saúde. Quando voltou dos Estados Unidos para Bangladesh, sua terra natal, em 2001, para coordenar um programa de prevenção de infecção em mulheres durante a gestação, o médico não conseguia sequer fazer uma ligação telefônica. “Levava um dia inteiro para falar com algum serviço médico central”, contou [...]. Em Bangladesh, mais de sete mil gestantes morrem anualmente em decorrência de infecções que poderiam ser tratadas no pré-natal. “Elas moram em regiões precárias, de difícil alcance, sem condições de higiene, com serviço de saúde praticamente inexistente”, relatou. Com tamanha dificuldade, Labrique percebeu que apenas ajuda médica seria insuficiente. Era urgente criar um sistema para saber quantas mulheres necessitavam de auxílio e o que era preciso para atendê-las com rapidez e provê-las com informações básicas. Com a chegada do celular ao país em 2004, Labrique testou o “M-Labor”, processo de envio de mensagens que, em um teste, ajudou 500 mulheres a saber o que fazer na hora do parto.
Em 2011, já com os smartphones, o projeto evoluiu para o aplicativo “M-Care”. Nele, membros da comunidade inserem quem são as mulheres e quais problemas enfrentam. Também trocam mensagens com os médicos e recebem orientações de como agir. A equipe fica de sobreaviso e, numa situação de emergência, é acionada com rapidez. O sistema ajuda ainda a elaborar dados para o desenvolvimento de programas para diminuir a alta mortalidade entre mulheres. Com ele, foi possível chegar a tempo a 89% dos nascimentos e evitar infecções prévias em 65% dos casos – antes, apenas 12% das mulheres tinham acesso a serviços médicos.
Com seu projeto, Labrique, na verdade, está fazendo parte da m-Health, um jeito novo de prestar e receber serviços dirigidos para a construção de uma vida saudável com base no uso de aparelhos portáteis de comunicação. O termo é a sigla, em inglês, de mobile health. Em português, quer dizer saúde móvel. Na prática, significa exatamente isso. Apenas com um smartphone ou um tablet na mão, hoje é possível fazer diagnósticos, registrar indicadores como taxa de açúcar no sangue ou nível de pressão arterial, conter um surto de ansiedade ou traçar um plano personalizado de treinos físicos, por exemplo, não importa o lugar onde se esteja. E com os mesmos aparelhos, as informações podem ser compartilhadas com quem for necessário. O paciente pode mandá-las para o médico, o médico para o paciente, o professor de medicina para o estudante, o médico para outro médico em busca de mais uma opinião. Enfim, é a saúde móvel, e a um toque dos dedos. [...]
O impacto dessa ciranda será profundo. “Como o paciente pode enviar os dados de qualquer lugar, em qualquer momento, essas informações podem ser analisadas em tempo real, com precisão, aumentando a eficácia do tratamento”, afirma o endocrinologista Gustavo Penna, chefe do Núcleo de TeleSaúde da Universidade Federal de Minas Gerais. “E o paciente tem maior controle sobre a sua saúde”, completa. Em razão dessa importância, a Organização Mundial da Saúde – entidade que dita as linhas de conduta para a saúde pública em todo o mundo – resolveu estabelecer diretrizes para que o potencial da m-Health seja aproveitado. O documento, publicado em 2011, exortou governos de todo o mundo a implementar e investir nessas tecnologias para conectar sistemas de saúde e aprimorar a eficácia do tratamento de doenças crônicas.
Esse novo patamar na história dos cuidados com o corpo só foi possível graças à fantástica evolução da telefonia celular. A chegada dos smartphones e dos tablets, com suas telas de alta resolução e microfones potentes, tornou realidade, entre outras façanhas, o desenvolvimento de aplicativos que captam imagens de fetos, identificam parasitas a partir da imagem de uma gota de sangue ou aferem a capacidade respiratória. Simultaneamente, houve a popularização dos celulares – de acordo com a União Internacional de Telecomunicação, o mundo conta com 5,8 bilhões de assinaturas de telefones móveis (somos sete bilhões de habitantes no planeta). E o setor de aplicativos em geral é um dos que mais crescem, atingindo a marca de 25 bilhões de downloads.[...]
A força do fenômeno está fazendo com que universidades no mundo todo comecem a construir centros especializados em m-Health, de olho em um futuro promissor. Um estudo da Associação Internacional de Operadoras de Celular prevê, por exemplo, que a saúde estará totalmente integrada à tecnologia móvel em 2027, gerando um mercado de mais de US$ 23 bilhões.[...]
(TARANTINO, Mônica; OLIVEIRA Monique. A saúde a um toque dos dedos. Revista Isto é – Medicina e Bem Estar – Nº Edição: 2213 – 05 abril 2012.)
A partir da leitura do texto, pode-se inferir que: