Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca da Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser a contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcaloide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mais triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
-Lá sou amigo do rei –
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
(BANDEIRA – Manuel. Libertinagem, In Poesia Completa e Prosa, Rio, Editora Aguilar, 2ª ed., 1967)
Avalie as afirmações sobre o texto em questão.
I – Sexo livre (insistentemente reiterado) coloca-se no conjunto de vantagens oferecidas pela “outra civilização” a que se refere o poeta.
II – As vantagens e compensações buscadas pelo poeta pressupõem seu descontentamento com o real concreto, visível no verso “Aqui não sou feliz”.
III- Na terceira estrofe, o refúgio imaginado pelo poeta torna possível uma série de ações comuns ou triviais, mas que fazem parte do cotidiano de um menino sadio, sem inibições físicas.
IV- O autor repete cinco vezes o verso “Vou-me embora pra Pasárgada”, como que alimentando um desejo permanente e crescente que, no entanto, ele mesmo confessa impossível de ser concretizado.
V- Ter a mulher que quiser, namorar prostitutas à vontade e consumir alcalóides são ações pretendidas pelo poeta e que caracterizam Pasárgada como uma espécie de reino da permissividade.