Leia o texto de Roberto DaMatta para responder à questão.
O mundo moderno assistiu ao nascimento de uma mudança radical na concepção de trabalho e pobreza. Antigamente, o trabalhador era o pobre, o homem comum. Os nobres faziam guerra e governavam. Eram o símbolo da autoridade e da justiça. Daí estarem excluídos do trabalho manual e, sobretudo, do trabalho na lavoura, que vergava o homem sobre si mesmo, fazendo-o encarar a terra, que é fonte de vida e também leito dos mortos.
Neste mundo, o nobre-rico, entretanto, tinha obrigação para com os pobres, os destituídos e os que eram obrigados a trabalhar. Dele deveria partir a esmola, o consolo e o exemplo de probidade, de acordo com o leque das virtudes cardeais que situava a caridade como a mais importante. Assim, os nobres estavam por cima, mas em termos, porque, melhor do que ninguém, sabiam que sem pobre não há rico e, se riqueza existe, ela se exprime precisamente pela obrigação de ajudar os necessitados. Caridade, honradez e honestidade eram parte crucial da agenda dos nobres.
O mundo moderno nasceu da destruição deste velho pacto entre ricos e pobres. Com o triunfo do mercado, acelerou-se o individualismo e tomou corpo a ideia de que cada qual deveria cuidar de si. O resultado foi o nascimento da ideia de que o pobre é aquele que não gosta de trabalhar e o rico é o sujeito premiado pelo seu esforço. Agora, pobre e rico não são mais duas faces de uma mesma moeda, mas são como dois corredores que, diz-se, começam a prova como iguais. O rico é o que chega primeiro, o pobre, por último.
Com isso, o trabalho deixou de ser um castigo e uma obrigação ligada a pobreza e a pecado para ser visto como uma vocação e um chamado. Algo que todos devem fazer porque o trabalho dignifica e eventualmente conduz à riqueza, que é uma prova de sucesso e de salvação.
(Explorações, 2011. Adaptado.)
No texto, o autor