Em entrevista à BBC Brasil, a jornalista Adriana Negreiros fala sobre o livro que acaba de lançar – Maria Bonita: Sexo, Violência e Mulheres no Cangaço (Objetiva). A seguir, são reproduzidas algumas das perguntas a que ela respondeu. Numere a coluna da direita, relacionando as respostas com as respectivas perguntas.
1. Como surgiu a ideia de escrever uma biografia de Maria Bonita?
2. Em que sentido diria que Maria Bonita foi uma mulher transgressora?
3. Você diz no livro que, durante a pesquisa, viu que os relatos das mulheres sobre o cangaço eram constantemente questionados. Como era isso?
( ) Sempre tive muito interesse no cangaço. Sou nordestina, do Ceará. Minha família é de Mossoró, a única cidade que conseguiu expulsar Lampião. Isso foi um marco na história do cangaço e é lembrado até hoje.
( ) Isso me chocou muito. Fui percebendo em conversas com pesquisadores do tema que as histórias delas eram desqualificadas. Muitas delas entraram no cangaço não porque quiseram, mas porque foram obrigadas. Foram raptadas. Não foi uma opção.
( ) Diferentemente da maioria das cangaceiras, ela entrou para o bando porque quis. Era empoderada para seu tempo e para aquele lugar. Vivia no sertão, nos anos 1920. Era uma mulher casada, de quem se esperava obediência ao marido.
Assinale a alternativa que apresenta a numeração correta da coluna da direita, de cima para baixo.
O texto a seguir é referência para a questão.
Os tatuís e o antropoceno
Você está em 2043. Cinco anos atrás, a civilização entrou em colapso. Metade da humanidade foi dizimada por epidemias, inundações, vazamentos em reatores nucleares, guerra civil. Os estados nacionais estão falidos. Não há mais elefantes, nem girafas, nem onças, nem centenas de outras espécies. A internet é lenta e deficiente, quase não funciona. Não há mais viagens aéreas. A comida é pouca e sempre a mesma. As usinas elétricas pararam de funcionar. A eletricidade é conseguida em pequena escala, com painéis solares.
Um dia, uma velhinha é assaltada por um jovem que rouba seus painéis solares. E aí começa o seguinte diálogo:
“Você faria isso com seus parentes?”
“Meus parentes morreram todos. E tiveram uma vida melhor que a minha. Você também teve. Sua eletricidade, seu carro, seu conforto... Vocês viveram bem _____ beça. Chegou _____ hora de pagar a conta. Você começa a pagar hoje. É como se eu fosse um oficial de justiça, sacou?”
“Mas não fui eu, pessoalmente, quem sujou o mundo. Foi o sistema. E é muito difícil mudar o sistema”.
“Então! É a mesma coisa. Não sou eu, pessoalmente, quem está roubando você. É o sistema. E é muito difícil mudar o sistema”
Essa cena está no romance The bone clocks, do escritor inglês David Mitchell, publicado em 2014. Ela me causou pesadelos durante algumas semanas, e continua me assombrando.
Trabalhei na área de meio ambiente durante alguns anos, e não foram poucos os relatórios, livros e artigos científicos que li sobre as catástrofes ecológicas contemporâneas e a devastação tão característica da nossa época. Mas nenhum desses documentos me deixou marcas tão profundas quanto o trecho que citei acima. Isso me fez pensar, mais uma vez, no potencial inigualável da literatura para evocar uma realidade. Talvez por isso a antropóloga Donna Haraway tenha sugerido que antropoceno não é uma palavra adequada para dar conta do terror da era em que vivemos. Em seu lugar, ela propôs o termo cthuluceno, em homenagem ao monstro apocalíptico criado pelo escritor H. P. Lovecraft.
Voltei a pensar no livro do David Mitchell ao esbarrar com uma fotografia que tirei na praia de Ipanema, anos atrás. Nela, meu filho de cinco anos segura um solitário tatuí na palma de sua mão. Era a primeira vez que ele via o pequeno crustáceo que eu encontrava aos milhares quando tinha a idade dele e frequentava _____ mesma praia. Naquele dia, passamos mais de uma hora caminhando na beira do mar _____ procura de outros tatuís, mas não achamos mais nenhum. Desde então, nunca mais vimos um tatuí.
O tatuí (Emerita brasiliensis), para quem nunca viu um, é (ou era) um bicho característico do litoral atlântico sulamericano, mais ou menos desde o Espírito Santo até o estuário do rio da Prata. Tem uns três ou quatro centímetros de comprimento e dizem que é muito saboroso (nunca provei, para mim seria como comer um animal doméstico). É uma espécie muito sensível _____ variações no ambiente e, por isso, tem sido usada como bioindicador, ou seja, como ferramenta para monitorar o estado do ecossistema em que vive. Fatores como aumento da poluição marinha e elevação da temperatura da água afetam rapidamente o comportamento, as características físicas e o ciclo de vida dos tatuís.
Uma vez li em algum lugar que, quanto mais calor no ambiente, mais rápido bate o pequeno coração do tatuí e, portanto, menor é o seu tempo de vida. Não sei se isso é verdade, mas não deixa de ser uma maneira tristemente poética de dar conta do desaparecimento dos tatuís das praias cariocas.
Em 2043, terei setenta e um anos. É difícil não me identificar com a velhinha da história. Mais difícil ainda acreditar que, no mundo de 2043, ainda existirão elefantes, girafas, onças e tatuís.
Bom, pelo menos nos restará o consolo de saber que não fomos nós, pessoalmente, que criamos esse mundo. Foi o... sistema.
(Gustavo Pacheco, diplomata e antropólogo. Disponível em: <https://epoca.globo.com/gustavo-pacheco/os-tatuis-oantropoceno-23031237>.)
Assinale a alternativa que preenche corretamente as lacunas desse texto.
O texto a seguir é referência para a questão.
Os tatuís e o antropoceno
Você está em 2043. Cinco anos atrás, a civilização entrou em colapso. Metade da humanidade foi dizimada por epidemias, inundações, vazamentos em reatores nucleares, guerra civil. Os estados nacionais estão falidos. Não há mais elefantes, nem girafas, nem onças, nem centenas de outras espécies. A internet é lenta e deficiente, quase não funciona. Não há mais viagens aéreas. A comida é pouca e sempre a mesma. As usinas elétricas pararam de funcionar. A eletricidade é conseguida em pequena escala, com painéis solares.
Um dia, uma velhinha é assaltada por um jovem que rouba seus painéis solares. E aí começa o seguinte diálogo:
“Você faria isso com seus parentes?”
“Meus parentes morreram todos. E tiveram uma vida melhor que a minha. Você também teve. Sua eletricidade, seu carro, seu conforto... Vocês viveram bem _____ beça. Chegou _____ hora de pagar a conta. Você começa a pagar hoje. É como se eu fosse um oficial de justiça, sacou?”
“Mas não fui eu, pessoalmente, quem sujou o mundo. Foi o sistema. E é muito difícil mudar o sistema”.
“Então! É a mesma coisa. Não sou eu, pessoalmente, quem está roubando você. É o sistema. E é muito difícil mudar o sistema”
Essa cena está no romance The bone clocks, do escritor inglês David Mitchell, publicado em 2014. Ela me causou pesadelos durante algumas semanas, e continua me assombrando.
Trabalhei na área de meio ambiente durante alguns anos, e não foram poucos os relatórios, livros e artigos científicos que li sobre as catástrofes ecológicas contemporâneas e a devastação tão característica da nossa época. Mas nenhum desses documentos me deixou marcas tão profundas quanto o trecho que citei acima. Isso me fez pensar, mais uma vez, no potencial inigualável da literatura para evocar uma realidade. Talvez por isso a antropóloga Donna Haraway tenha sugerido que antropoceno não é uma palavra adequada para dar conta do terror da era em que vivemos. Em seu lugar, ela propôs o termo cthuluceno, em homenagem ao monstro apocalíptico criado pelo escritor H. P. Lovecraft.
Voltei a pensar no livro do David Mitchell ao esbarrar com uma fotografia que tirei na praia de Ipanema, anos atrás. Nela, meu filho de cinco anos segura um solitário tatuí na palma de sua mão. Era a primeira vez que ele via o pequeno crustáceo que eu encontrava aos milhares quando tinha a idade dele e frequentava _____ mesma praia. Naquele dia, passamos mais de uma hora caminhando na beira do mar _____ procura de outros tatuís, mas não achamos mais nenhum. Desde então, nunca mais vimos um tatuí.
O tatuí (Emerita brasiliensis), para quem nunca viu um, é (ou era) um bicho característico do litoral atlântico sulamericano, mais ou menos desde o Espírito Santo até o estuário do rio da Prata. Tem uns três ou quatro centímetros de comprimento e dizem que é muito saboroso (nunca provei, para mim seria como comer um animal doméstico). É uma espécie muito sensível _____ variações no ambiente e, por isso, tem sido usada como bioindicador, ou seja, como ferramenta para monitorar o estado do ecossistema em que vive. Fatores como aumento da poluição marinha e elevação da temperatura da água afetam rapidamente o comportamento, as características físicas e o ciclo de vida dos tatuís.
Uma vez li em algum lugar que, quanto mais calor no ambiente, mais rápido bate o pequeno coração do tatuí e, portanto, menor é o seu tempo de vida. Não sei se isso é verdade, mas não deixa de ser uma maneira tristemente poética de dar conta do desaparecimento dos tatuís das praias cariocas.
Em 2043, terei setenta e um anos. É difícil não me identificar com a velhinha da história. Mais difícil ainda acreditar que, no mundo de 2043, ainda existirão elefantes, girafas, onças e tatuís.
Bom, pelo menos nos restará o consolo de saber que não fomos nós, pessoalmente, que criamos esse mundo. Foi o... sistema.
(Gustavo Pacheco, diplomata e antropólogo. Disponível em: <https://epoca.globo.com/gustavo-pacheco/os-tatuis-oantropoceno-23031237>.)
Pelas características desse texto, trata-se de:
O texto a seguir é referência para a questão.
Os tatuís e o antropoceno
Você está em 2043. Cinco anos atrás, a civilização entrou em colapso. Metade da humanidade foi dizimada por epidemias, inundações, vazamentos em reatores nucleares, guerra civil. Os estados nacionais estão falidos. Não há mais elefantes, nem girafas, nem onças, nem centenas de outras espécies. A internet é lenta e deficiente, quase não funciona. Não há mais viagens aéreas. A comida é pouca e sempre a mesma. As usinas elétricas pararam de funcionar. A eletricidade é conseguida em pequena escala, com painéis solares.
Um dia, uma velhinha é assaltada por um jovem que rouba seus painéis solares. E aí começa o seguinte diálogo:
“Você faria isso com seus parentes?”
“Meus parentes morreram todos. E tiveram uma vida melhor que a minha. Você também teve. Sua eletricidade, seu carro, seu conforto... Vocês viveram bem _____ beça. Chegou _____ hora de pagar a conta. Você começa a pagar hoje. É como se eu fosse um oficial de justiça, sacou?”
“Mas não fui eu, pessoalmente, quem sujou o mundo. Foi o sistema. E é muito difícil mudar o sistema”.
“Então! É a mesma coisa. Não sou eu, pessoalmente, quem está roubando você. É o sistema. E é muito difícil mudar o sistema”
Essa cena está no romance The bone clocks, do escritor inglês David Mitchell, publicado em 2014. Ela me causou pesadelos durante algumas semanas, e continua me assombrando.
Trabalhei na área de meio ambiente durante alguns anos, e não foram poucos os relatórios, livros e artigos científicos que li sobre as catástrofes ecológicas contemporâneas e a devastação tão característica da nossa época. Mas nenhum desses documentos me deixou marcas tão profundas quanto o trecho que citei acima. Isso me fez pensar, mais uma vez, no potencial inigualável da literatura para evocar uma realidade. Talvez por isso a antropóloga Donna Haraway tenha sugerido que antropoceno não é uma palavra adequada para dar conta do terror da era em que vivemos. Em seu lugar, ela propôs o termo cthuluceno, em homenagem ao monstro apocalíptico criado pelo escritor H. P. Lovecraft.
Voltei a pensar no livro do David Mitchell ao esbarrar com uma fotografia que tirei na praia de Ipanema, anos atrás. Nela, meu filho de cinco anos segura um solitário tatuí na palma de sua mão. Era a primeira vez que ele via o pequeno crustáceo que eu encontrava aos milhares quando tinha a idade dele e frequentava _____ mesma praia. Naquele dia, passamos mais de uma hora caminhando na beira do mar _____ procura de outros tatuís, mas não achamos mais nenhum. Desde então, nunca mais vimos um tatuí.
O tatuí (Emerita brasiliensis), para quem nunca viu um, é (ou era) um bicho característico do litoral atlântico sulamericano, mais ou menos desde o Espírito Santo até o estuário do rio da Prata. Tem uns três ou quatro centímetros de comprimento e dizem que é muito saboroso (nunca provei, para mim seria como comer um animal doméstico). É uma espécie muito sensível _____ variações no ambiente e, por isso, tem sido usada como bioindicador, ou seja, como ferramenta para monitorar o estado do ecossistema em que vive. Fatores como aumento da poluição marinha e elevação da temperatura da água afetam rapidamente o comportamento, as características físicas e o ciclo de vida dos tatuís.
Uma vez li em algum lugar que, quanto mais calor no ambiente, mais rápido bate o pequeno coração do tatuí e, portanto, menor é o seu tempo de vida. Não sei se isso é verdade, mas não deixa de ser uma maneira tristemente poética de dar conta do desaparecimento dos tatuís das praias cariocas.
Em 2043, terei setenta e um anos. É difícil não me identificar com a velhinha da história. Mais difícil ainda acreditar que, no mundo de 2043, ainda existirão elefantes, girafas, onças e tatuís.
Bom, pelo menos nos restará o consolo de saber que não fomos nós, pessoalmente, que criamos esse mundo. Foi o... sistema.
(Gustavo Pacheco, diplomata e antropólogo. Disponível em: <https://epoca.globo.com/gustavo-pacheco/os-tatuis-oantropoceno-23031237>.)
No trecho “Voltei a pensar no livro do David Mitchell ao esbarrar com uma fotografia que tirei na praia de Ipanema, anos atrás”, estabelece-se entre “Voltei a pensar” e “esbarrar com uma fotografia” uma relação de:
O texto a seguir é referência para a questão.
Os tatuís e o antropoceno
Você está em 2043. Cinco anos atrás, a civilização entrou em colapso. Metade da humanidade foi dizimada por epidemias, inundações, vazamentos em reatores nucleares, guerra civil. Os estados nacionais estão falidos. Não há mais elefantes, nem girafas, nem onças, nem centenas de outras espécies. A internet é lenta e deficiente, quase não funciona. Não há mais viagens aéreas. A comida é pouca e sempre a mesma. As usinas elétricas pararam de funcionar. A eletricidade é conseguida em pequena escala, com painéis solares.
Um dia, uma velhinha é assaltada por um jovem que rouba seus painéis solares. E aí começa o seguinte diálogo:
“Você faria isso com seus parentes?”
“Meus parentes morreram todos. E tiveram uma vida melhor que a minha. Você também teve. Sua eletricidade, seu carro, seu conforto... Vocês viveram bem _____ beça. Chegou _____ hora de pagar a conta. Você começa a pagar hoje. É como se eu fosse um oficial de justiça, sacou?”
“Mas não fui eu, pessoalmente, quem sujou o mundo. Foi o sistema. E é muito difícil mudar o sistema”.
“Então! É a mesma coisa. Não sou eu, pessoalmente, quem está roubando você. É o sistema. E é muito difícil mudar o sistema”
Essa cena está no romance The bone clocks, do escritor inglês David Mitchell, publicado em 2014. Ela me causou pesadelos durante algumas semanas, e continua me assombrando.
Trabalhei na área de meio ambiente durante alguns anos, e não foram poucos os relatórios, livros e artigos científicos que li sobre as catástrofes ecológicas contemporâneas e a devastação tão característica da nossa época. Mas nenhum desses documentos me deixou marcas tão profundas quanto o trecho que citei acima. Isso me fez pensar, mais uma vez, no potencial inigualável da literatura para evocar uma realidade. Talvez por isso a antropóloga Donna Haraway tenha sugerido que antropoceno não é uma palavra adequada para dar conta do terror da era em que vivemos. Em seu lugar, ela propôs o termo cthuluceno, em homenagem ao monstro apocalíptico criado pelo escritor H. P. Lovecraft.
Voltei a pensar no livro do David Mitchell ao esbarrar com uma fotografia que tirei na praia de Ipanema, anos atrás. Nela, meu filho de cinco anos segura um solitário tatuí na palma de sua mão. Era a primeira vez que ele via o pequeno crustáceo que eu encontrava aos milhares quando tinha a idade dele e frequentava _____ mesma praia. Naquele dia, passamos mais de uma hora caminhando na beira do mar _____ procura de outros tatuís, mas não achamos mais nenhum. Desde então, nunca mais vimos um tatuí.
O tatuí (Emerita brasiliensis), para quem nunca viu um, é (ou era) um bicho característico do litoral atlântico sulamericano, mais ou menos desde o Espírito Santo até o estuário do rio da Prata. Tem uns três ou quatro centímetros de comprimento e dizem que é muito saboroso (nunca provei, para mim seria como comer um animal doméstico). É uma espécie muito sensível _____ variações no ambiente e, por isso, tem sido usada como bioindicador, ou seja, como ferramenta para monitorar o estado do ecossistema em que vive. Fatores como aumento da poluição marinha e elevação da temperatura da água afetam rapidamente o comportamento, as características físicas e o ciclo de vida dos tatuís.
Uma vez li em algum lugar que, quanto mais calor no ambiente, mais rápido bate o pequeno coração do tatuí e, portanto, menor é o seu tempo de vida. Não sei se isso é verdade, mas não deixa de ser uma maneira tristemente poética de dar conta do desaparecimento dos tatuís das praias cariocas.
Em 2043, terei setenta e um anos. É difícil não me identificar com a velhinha da história. Mais difícil ainda acreditar que, no mundo de 2043, ainda existirão elefantes, girafas, onças e tatuís.
Bom, pelo menos nos restará o consolo de saber que não fomos nós, pessoalmente, que criamos esse mundo. Foi o... sistema.
(Gustavo Pacheco, diplomata e antropólogo. Disponível em: <https://epoca.globo.com/gustavo-pacheco/os-tatuis-oantropoceno-23031237>.)
O uso de reticências no último período do texto tem a função de:
O texto a seguir é referência para a questão.
Os tatuís e o antropoceno
Você está em 2043. Cinco anos atrás, a civilização entrou em colapso. Metade da humanidade foi dizimada por epidemias, inundações, vazamentos em reatores nucleares, guerra civil. Os estados nacionais estão falidos. Não há mais elefantes, nem girafas, nem onças, nem centenas de outras espécies. A internet é lenta e deficiente, quase não funciona. Não há mais viagens aéreas. A comida é pouca e sempre a mesma. As usinas elétricas pararam de funcionar. A eletricidade é conseguida em pequena escala, com painéis solares.
Um dia, uma velhinha é assaltada por um jovem que rouba seus painéis solares. E aí começa o seguinte diálogo:
“Você faria isso com seus parentes?”
“Meus parentes morreram todos. E tiveram uma vida melhor que a minha. Você também teve. Sua eletricidade, seu carro, seu conforto... Vocês viveram bem _____ beça. Chegou _____ hora de pagar a conta. Você começa a pagar hoje. É como se eu fosse um oficial de justiça, sacou?”
“Mas não fui eu, pessoalmente, quem sujou o mundo. Foi o sistema. E é muito difícil mudar o sistema”.
“Então! É a mesma coisa. Não sou eu, pessoalmente, quem está roubando você. É o sistema. E é muito difícil mudar o sistema”
Essa cena está no romance The bone clocks, do escritor inglês David Mitchell, publicado em 2014. Ela me causou pesadelos durante algumas semanas, e continua me assombrando.
Trabalhei na área de meio ambiente durante alguns anos, e não foram poucos os relatórios, livros e artigos científicos que li sobre as catástrofes ecológicas contemporâneas e a devastação tão característica da nossa época. Mas nenhum desses documentos me deixou marcas tão profundas quanto o trecho que citei acima. Isso me fez pensar, mais uma vez, no potencial inigualável da literatura para evocar uma realidade. Talvez por isso a antropóloga Donna Haraway tenha sugerido que antropoceno não é uma palavra adequada para dar conta do terror da era em que vivemos. Em seu lugar, ela propôs o termo cthuluceno, em homenagem ao monstro apocalíptico criado pelo escritor H. P. Lovecraft.
Voltei a pensar no livro do David Mitchell ao esbarrar com uma fotografia que tirei na praia de Ipanema, anos atrás. Nela, meu filho de cinco anos segura um solitário tatuí na palma de sua mão. Era a primeira vez que ele via o pequeno crustáceo que eu encontrava aos milhares quando tinha a idade dele e frequentava _____ mesma praia. Naquele dia, passamos mais de uma hora caminhando na beira do mar _____ procura de outros tatuís, mas não achamos mais nenhum. Desde então, nunca mais vimos um tatuí.
O tatuí (Emerita brasiliensis), para quem nunca viu um, é (ou era) um bicho característico do litoral atlântico sulamericano, mais ou menos desde o Espírito Santo até o estuário do rio da Prata. Tem uns três ou quatro centímetros de comprimento e dizem que é muito saboroso (nunca provei, para mim seria como comer um animal doméstico). É uma espécie muito sensível _____ variações no ambiente e, por isso, tem sido usada como bioindicador, ou seja, como ferramenta para monitorar o estado do ecossistema em que vive. Fatores como aumento da poluição marinha e elevação da temperatura da água afetam rapidamente o comportamento, as características físicas e o ciclo de vida dos tatuís.
Uma vez li em algum lugar que, quanto mais calor no ambiente, mais rápido bate o pequeno coração do tatuí e, portanto, menor é o seu tempo de vida. Não sei se isso é verdade, mas não deixa de ser uma maneira tristemente poética de dar conta do desaparecimento dos tatuís das praias cariocas.
Em 2043, terei setenta e um anos. É difícil não me identificar com a velhinha da história. Mais difícil ainda acreditar que, no mundo de 2043, ainda existirão elefantes, girafas, onças e tatuís.
Bom, pelo menos nos restará o consolo de saber que não fomos nós, pessoalmente, que criamos esse mundo. Foi o... sistema.
(Gustavo Pacheco, diplomata e antropólogo. Disponível em: <https://epoca.globo.com/gustavo-pacheco/os-tatuis-oantropoceno-23031237>.)
Com base no texto, considere as seguintes afirmativas:
1. A expressão “para mim seria como comer um animal doméstico” denota a afeição do autor pelos tatuís.
2. O autor concorda que a palavra “antropoceno” não é adequada porque entende que os problemas ambientais não são causados diretamente pelos homens, mas pelo sistema.
3. “Desde então” (final do 9º parágrafo) refere-se ao momento em que o autor esbarrou com a fotografia tirada com o filho na praia de Ipanema.
Assinale a alternativa correta.