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“Situado na Quinta da Boa Vista, a algumas centenas de metros do Estádio do Maracanã, com vista para o morro da Mangueira, este é um dos museus mais estranhos do Brasil. Seu acervo reúne (...) aves e animais empalhados e vestimentas de tribos indígenas abrigadas em caixas de vidro que lembram vitrinas de lojas das cidades do interior. As peças estão distribuídas ao acaso, sem critério de organização ou identificação. O Museu Nacional é ainda mais esquisito pelo que esconde do que pelo que exibe. O prédio que o abriga, o Palácio de São Cristóvão, foi o cenário de um dos eventos mais extraordinários da história brasileira.
Ali viveu e reinou o único soberano europeu a colocar os pés em terras americanas em mais de quatro séculos. Ali, D. João VI, rei do Brasil e de Portugal, recebeu seus súditos, ministros, diplomatas e visitantes estrangeiros durante mais de uma década. Ali, aconteceu a transformação do Brasil colônia num país independente. Apesar de sua importância histórica, quase nada no Palácio de São Cristóvão lembra a corte de Portugal no Rio de Janeiro. A construção retangular de três andares, que D. João ganhou de presente de um grande traficante de escravos ao chegar ao Brasil, em 1808, é hoje um prédio descuidado e sem memória. Nenhuma placa indica onde eram os dormitórios, a cozinha, as cavalariças e as demais dependências usadas pela família real. É como se nesse local a História tivesse sido apagada de propósito.
A mesma sensação de descaso se repete no centro do Rio de Janeiro, onde outro prédio deveria guardar lembranças importantes desse período. Localizado na Praça 15 de Novembro, em frente à estação das barcas que fazem a travessia da Baía da Guanabara em direção a Niterói, o antigo Paço Imperial é um casarão de dois andares do século XVII. Foi a sede oficial do governo de D. João no Brasil, entre 1808 e 1821, mas hoje um turista desavisado poderia passar por ele sem tomar conhecimento dessa informação. Com exceção de uma carruagem antiga, de madeira e sem identificação, exposta junto à janela direita da entrada principal, nada ali faz referência a seu passado histórico. (...)
O desprezo pela conservação dos monumentos históricos nunca foi novidade no Brasil. No caso de D. João VI, porém, há um aspecto adicional que acentua a sensação de esquecimento forçado que o cerca. É a forma caricata com que o rei e sua corte costumam ser tratados nos livros, no cinema, no teatro e na televisão. (...)
Obviamente, o Brasil de D. João VI não se resume a graçolas. A fuga da família real para o Rio de Janeiro ocorreu num dos momentos mais apaixonantes e revolucionários do Brasil e de Portugal, em que grupos de interesses tão diversos (...) se opunham numa luta pelo poder que haveria de mudar radicalmente a história desses dois países. É natural, portanto, que a visão que se tem de D. João VI, Carlota Joaquina e sua corte permaneça ainda hoje contaminada pelas disputas políticas em que se envolveram. Isso explica tanto a sensação de abandono que cerca os lugares freqüentados pela realeza como a carga de preconceito que ainda a acompanha nas obras que inspirou.”
Todas estas idéias podem ser inferidas da leitura do texto, EXCETO: